Nota de Imprensa

Astrónomos revelam linha interestelar de um dos blocos constituintes da vida

ALMA e Rosetta mapeiam viagem do fósforo

15 de Janeiro de 2020

O fósforo, presente no nosso DNA e nas membranas as células, é um elemento essencial à vida tal como a conhecemos. No entanto, o modo como este elemento chegou à Terra primordial é ainda um mistério. Com o auxílio do poder combinado do ALMA e da sonda Rosetta, da Agência Espacial Europeia, os astrónomos traçaram agora a viagem do fósforo, desde as regiões de formação estelar até aos cometas. Este trabalho de investigação mostra pela primeira vez onde é que as moléculas que contêm fósforo se formam, como é que este elemento é transportado nos cometas e como é que uma molécula particular pode ter desempenhado um papel crucial no início da vida no nosso planeta.

A vida apareceu na Terra há cerca de 4 mil milhões de anos, mas ainda não sabemos bem quais os processos que a tornaram possível," diz Víctor Rivilla, o autor principal de um novo estudo publicado hoje na revista da especialidade Monthly Notices of the Royal Astronomical Society. Os novos resultados do Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), do qual o Observatório Europeu do Sul (ESO) é parceiro, e do instrumento ROSINA a bordo da sonda espacial Rosetta da Agência Espacial Europeia (ESA), mostram que o monóxido de fósforo é uma peça crucial no puzzle da origem da vida.

Com o auxílio do ALMA, que permitiu observar de forma detalhada a região de formação estelar AFGL 5142, os astrónomos conseguiram localizar onde é que moléculas com fósforo, como o monóxido de fósforo, se formam. As novas estrelas e sistemas planetários formam-se em regiões nebulosas de gás e poeira existentes entre as estrelas, fazendo destas nuvens interestelares os locais ideais para procurar os blocos constituintes da vida.

As observações ALMA mostraram que moléculas que contêm fósforo são criadas quando estrelas massivas se formam. Correntes de gás emitidas pelas jovens estrelas massivas abrem cavidades nas nuvens interestelares e moléculas que contêm fósforo formam-se nas paredes destas cavidades, através da ação combinada de choques e radiação da estrela bebé. Os astrónomos mostraram também que o monóxido de fósforo é a molécula com fósforo mais abundante nas paredes das cavidades.

Após procurar com o ALMA esta molécula nas regiões de formação estelar, a equipa europeia concentrou-se seguidamente num objeto do Sistema Solar: o famoso cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko. A ideia consistia em seguir o percurso destes compostos de fósforo. Se as paredes da cavidade colapsam para formar estrelas, em particular nas menos massivas como o nosso Sol, o monóxido de fósforo pode congelar e encontrar-se preso nos grãos de poeira gelados que permanecem em torno da nova estrela. Ainda antes da estrela estar completamente formada, estes grãos de poeira juntam-se formando pequenos calhaus, rochas e eventualmente cometas, estes últimos tornando-se os transportadores do monóxido de fósforo.

ROSINA (Rosetta Orbiter Spectrometer for Ion and Neutral Analysis) colectou dados do 67P durante os dois anos em que Rosetta orbitou este cometa. Os astrónomos já tinham descoberto anteriormente traços de fósforo nos dados de ROSINA, mas não sabiam que molécula é que o teria transportado até lá. Kathrin Altwegg, Investigadora Principal de ROSINA e uma das autoras deste novo estudo, recebeu uma pista do que é que esta molécula poderia ser durante uma conversa numa conferência com uma astrónoma que estuda regiões de formação estelar com o ALMA: ”Ela disse-me que o monóxido de fósforo seria um candidato muito provável, por isso voltei a analisar os nossos dados e realmente lá estava ele!

Esta primeira observação de monóxido de fósforo num cometa ajuda os astrónomos a estabelecerem uma ligação entre as regiões de formação estelar, onde a molécula é criada, e a Terra.

A combinação de dados ALMA e ROSINA revelou uma espécie de linha condutora química durante todo o processo de formação estelar e onde o monóxido de fósforo desempenha um papel principal,” diz Rivilla, investigador no Observatório Astrofísico de Arcetri do INAF, o Instituto Nacional de Astrofísica de Itália.

O fósforo é essencial à vida tal como a conhecemos,” acrescenta Altwegg. “Como muito provavelmente os cometas transportaram enormes quantidades de compostos orgânicos para a Terra, o monóxido de fósforo encontrado no cometa 67P poderá fortalecer a ligação entre cometas e a vida na Terra.

Esta viagem intrigante pôde ser documentada graças aos esforços de colaboração entre astrónomos. “A deteção de monóxido de fósforo deveu-se claramente a uma troca interdisciplinar entre telescópios na Terra e instrumentos no espaço,” diz Altwegg.

Leonardo Testi, astronómo do ESO e Gestor de Operações do ALMA na Europa, conclui: “Compreender as nossas origens cósmicas, incluindo quão comuns são as condições químicas favoráveis ao aparecimento de vida, é um tópico principal da astrofísica moderna. Enquanto o ESO e o ALMA se focam em observações de moléculas em sistemas planetários jovens distantes, a exploração direta do inventário químico no seio do nosso Sistema Solar torna-se possível graças a missões da ESA, como Rosetta. A sinergia entre infraestruturas líder mundiais colocadas no solo e no espaço, através da colaboração entre o ESO e a ESA, é uma mais valia muito poderosa para os investigadores europeus, permitindo descobertas verdadeiramente transformadoras como a que é descrita neste trabalho.

Informações adicionais

Este trabalho foi descrito num artigo científico publicado na revista da especialidade Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

A equipa é composta por V. M. Rivilla (INAF-Osservatorio Astrofisico di Arcetri, Florença, Itália [INAF-OAA]), M. N. Drozdovskaya (Centro do Espaço e Habitabilidade, Universidade de Berna, Suíça [CSH]), K. Altwegg (Physikalisches Institut, Universidade de Berna, Suíça), P. Caselli (Instituto Max Planck de Física Extraterrestre, Garching, Alemanha), M. T. Beltrán (INAF-OAA), F. Fontani (INAF-OAA), F.F.S. van der Tak (SRON Instituto Holandês de Investigação Espacial e Instituto Astronómico Kapteyn, Universidade de Groningen, Holanda), R. Cesaroni (INAF-OAA), A. Vasyunin (Universidade Federal Ural, Ekaterinburg, Rússia, e Universidade de Ciências Aplicadas Ventspils, Letónia), M. Rubin (CSH), F. Lique (LOMC-UMR, CNRS–Université du Havre), S. Marinakis (University of East London e Queen Mary University of London, RU), L. Testi (INAF-OAA, ESO Garching e Excellence Cluster “Universe”, Alemanha) e equipa ROSINA (H. Balsiger, J. J. Berthelier, J. De Keyser, B. Fiethe, S. A. Fuselier, S. Gasc, T. I. Gombosi, T. Sémon, C. -y. Tzou).

O Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), uma infraestrutura astronómica internacional, surge no âmbito de uma parceria entre o ESO, a Fundação Nacional de Ciências dos Estados Unidos (NSF) e os Institutos Nacionais de Ciências da Natureza (NINS) do Japão, em cooperação com a República do Chile. O ALMA é financiado pelo ESO em prol dos seus Estados Membros, pela NSF em cooperação com o Conselho de Investigação Nacional do Canadá (NRC) e do Conselho Nacional Científico da Taiwan (NSC) e pelo NINS em cooperação com a Academia Sinica (AS) da Taiwan e o Instituto de Astronomia e Ciências do Espaço da Coreia (KASI). A construção e operação do ALMA é coordenada pelo ESO, em prol dos seus Estados Membros; pelo Observatório Nacional de Rádio Astronomia dos Estados Unidos (NRAO), que é gerido pela Associação de Universidades, Inc. (AUI), em prol da América do Norte e pelo Observatório Astronómico Nacional do Japão (NAOJ), em prol do Leste Asiático. O Observatório Conjunto ALMA (JAO) fornece uma liderança e gestão unificadas na construção, comissionamento e operação do ALMA.

O ESO é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é de longe o observatório astronómico mais produtivo do mundo. O ESO é  financiado por 16 países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Polónia, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça, assim como pelo Chile, o país de acolhimento, e pela Austrália, como parceiro estratégico. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e operação de observatórios astronómicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrónomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronómica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera  o Very Large Telescope, o observatório astronómico óptico mais avançado do mundo e dois telescópios de rastreio. O VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo que trabalha no infravermelho e o VLT Survey Telescope, o maior telescópio concebido exclusivamente para mapear os céus no visível. O ESO é um parceiro principal no ALMA, o maior projeto astronómico que existe atualmente. E no Cerro Armazones, próximo do Paranal, o ESO está a construir o Extremely Large Telescope (ELT) de 39 metros, que será “o maior olho do mundo virado para o céu”.

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Contactos

Víctor Rivilla
INAF Arcetri Astrophysical Observatory
Florence, Italy
Tel.: +39 055 2752 319
Email: rivilla@arcetri.astro.it

Kathrin Altwegg
University of Bern
Bern, Switzerland
Tel.: +41 31 631 44 20
Email: kathrin.altwegg@space.unibe.ch

Leonardo Testi
European Southern Observatory
Garching bei München, Germany
Tel.: +49 89 3200 6541
Email: ltesti@eso.org

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Garching bei München, Germany
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Telm.: +49 151 241 664 00
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Margarida Serote (press contact Portugal)
ESO Science Outreach Network and Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço,
Tel.: +351 964951692
Email: eson-portugal@eso.org

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Este texto é a tradução da Nota de Imprensa do ESO eso2001, cortesia do ESON, uma rede de pessoas nos Países Membros do ESO, que servem como pontos de contacto local com os meios de comunicação social, em ligação com os desenvolvimentos do ESO. A representante do nodo português é Margarida Serote.

Sobre a Nota de Imprensa

Nº da Notícia:eso2001pt
Nome:67P/Churyumov-Gerasimenko, AFGL 5142
Tipo:Solar System : Interplanetary Body : Comet
Milky Way : Nebula : Type : Star Formation
Facility:Atacama Large Millimeter/submillimeter Array
Science data:2020MNRAS.492.1180R

Imagens

Moléculas que contêm fósforo descobertas em região de formação estelar e cometa 67P
Moléculas que contêm fósforo descobertas em região de formação estelar e cometa 67P
Imagem ALMA da região de formação estelar AFGL 5142
Imagem ALMA da região de formação estelar AFGL 5142
Imagem Rosetta do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko
Imagem Rosetta do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko
Localização da AFGL 5142 na constelação do Cocheiro
Localização da AFGL 5142 na constelação do Cocheiro
Imagem de grande angular da região do céu onde se situa a AFGL 5142
Imagem de grande angular da região do céu onde se situa a AFGL 5142

Vídeos

ESOcast 215 Light: Revelada linha interestelar de um dos blocos constituintes da vida
ESOcast 215 Light: Revelada linha interestelar de um dos blocos constituintes da vida
Aproximação à região de formação estelar AFGL 5142
Aproximação à região de formação estelar AFGL 5142
Animação do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko
Animação do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko
Animação das moléculas que contêm fósforo descobertas em região de formação estelar e cometa 67P
Animação das moléculas que contêm fósforo descobertas em região de formação estelar e cometa 67P